06 abril 2008

O bem-vindo retorno de Falstaff

Produção original de 2003, o "Falstaff" do Municipal paulistano ainda tem muito o que mostrar.

É senso comum que o Brasil ainda não detém uma cena operística condizente com a efervescência cultural de seus centros urbanos. Se parte desta escassez é explicada pelos custos necessariamente altos que mesmo a mais simples montagem de ópera demanda, logo mostra-se urgente tornar mais perene as montagens realizadas no passado recente.

É por este caminho que se envereda a atual temporada de ópera do Theatro Municipal de São Paulo, iniciada pela remontagem de "Falstaff", de Giuseppe Verdi, uma produção original da casa estreada em 2003. A temporada ainda revisitará a produção de 2004 de "Colombo", de Carlos Gomes, e levará ao palco duas co-produções de casas co-irmãs: o elogiadíssimo "O castelo do Barba-Azul", de Béla Bartók (produção do Palácio das Artes, Belo Horizonte), e "Ariadne em Naxos", de Richard Strauss (produção do Festival Amazonas de Ópera que estreará este mês na capital manauara). Mas nem só de repetecos vive o Municipal, que também produzirá novas montagens, entre as quais, "Madame Butterfly", de Giacomo Puccini.

Mas voltemos ao Falstaff. Ópera singular dentro da produção verdiana, ela é marcada por uma escrita parcamente cantabile (ao menos para os padrões verdianos), na qual os momentos onde se pode finalmente poderia se esperar uma "bela ária" ou dueto são necessariamente interrompidos por outros desenvolvimentos da trama. Esta peculiaridade acaba por delegar aos cantores um peso ainda maior sob sua desenvoltura dramática, agravada pelo fato de se tratar de uma ópera buffa (afinal, fazer rir não é lá das tarefas mais fáceis para ator algum).

Neste sentido, só resta mesmo elogios ao trabalho musical e cênico empreendido pelo baixo-barítono Lício Bruno, na pele (e banhas) do glutão Falstaff. Com um trabalho corporal bem elaborado, Bruno conferiu ao personagem de Shakespeare a comicidade necessária, aliada ao seu desempenho vocal, algo que o cantor já havia feito de forma magistral no passado com outro personagem shakespeare-verdiano, isto é, o Iago do "Otello", na montagem de Manaus.

Apesar de a cargo de papéis menos exigentes, foram também exemplares as performances de Leonardo Estévez (como Ford), e o quarteto das "alegres comadres de Windsor", integrado por Regina Elena Mesquita, Laura de Souza, Flávia Fernandes e Edinéia de Oliveira. Neste ponto, é importante notar o bom trabalho do diretor José Possi Neto na obtenção de um espetáculo alegre e fluído.

De uma maneira geral o maestro chileno Rodolfo Fischer conduziu de forma competente a Orquestra Sinfônica Municipal e o Coral Lírico, e mesmos certos problemas (tal como a leve falta sincronia entre vozes e orquestra no final do primeiro ato) não foram suficientemente comprometedores pois, ao final de tudo, os risos e a alegria a tudo redimem.

Foto: Lício Bruno, como Falstaff (à esquerda) e Leonardo Estévez, como Ford.

Um comentário:

Anônimo disse...

valeu, leonardo. et vive la musique et le bom humor.
joêzer