30 novembro 2005

Mozart com Kung Fu

Tinha tudo pra ser um bom filme, mas não é. O que não quer dizer que não mereça ser visto (ainda que daqui alguns anos na tevê aberta...).

Estreado recentemente no Brasil, o filme "Cão de Briga" (Danny the Dog) tem uma história simples, porém instigante: um descendente asiático (Danny) é criado como um cão matador - com incríveis habilidades em artes marciais orientais - que após fugir de seu "dono" tenta recuperar seu passado ao mesmo tempo que tenta se tornar gente, tal como na célebre história de Kaspar Hauser (filmada em 1974 por Werner Herzog), ocorrido no século XIX na Alemanha.

Nesta procura por sua identidade, Danny (vivido pelo lutador/ator Jet Li) conhece Sam (Morgan Freeman), um afinador de pianos cego que adota Danny e o leva para morar consigo e com sua filha adotiva, Victoria (Kerry Condon)

Victoria é uma jovem estudante de piano, e é por meio de tênues lembranças excitadas por este instrumento que Danny aos poucos vai colhendo as pistas sobre suas origens.

A grande revelação surge quando Victoria toca a bela "Sonata No. 11, em Lá Maior" de Mozart, que funciona como um gatilho para a fúria de carniceira de Danny contra seu algoz, o agiota Bart (vivido Bob Hoskins).

Como disse, tinha tudo pra ser um bom filme, mas...

Mas o problema é que não se quiz fazer um "bom filme", mas sim um "kung foo movie". Aí fodeu... Mesmo a sina carniceira de Danny limita-se a um balé acrobático, uma das heranças de "Matrix" que ainda se fazem sensíveis em Hollywood.

O filme é péssimamente dirigido por Louis Leterrier, o que não ajuda no roteiro "de ação" de Luc Besson. Apesar de toda a importância que a música clássica tem na história, toda a trilha fica a cargo da banda Massive Atack.

E como todo caipira que convida uma banda pra tocar em sua festa, fez-se questão que ela toque o tempo todo, enquanto que a música incidental poderia ter se limitado às cenas de luta. Em filmes de ação parece ser uma regra impedir o silêncio a qualquer custo.

Enfim, apesar de algumas temáticas interessantes, é um filme que se afunda no próprio estereótipo de mercado ao qual ele quer se associar. Azar o nosso...

24 novembro 2005

Fruto proibido

Novo CD de Cecilia Bartoli é dedicado ao repertório composto numa época em que a ópera foi banida de Roma.

Em Roma, o ano 1700 foi um ano de jubileu, isto é, inteiramente dedicado à comemoração religiosa (no caso, os 1700 anos do nascimento de Jesus Cristo). Desta forma, ficava proibida a apresentação de qualquer espetáculo público não religioso, tal como até recentemente ocorria no Brasil em qualquer "período santo" (quem nunca ouviu falar, ou mesmo viveu, nas antigas Semanas Santas em que todas rádios passavam a tocar música sacra e estabelecimentos como cinemas e teatros simplesmente deixavam de funcionar?).

Seguindo-se ao jubileu de 1700, uma série de condições políticas e religiosas foi prorrogando esta situação até 1710, quando após uma década ocorreram as primeiras tentativas de se retomar a produção de espetáculos não sacros públicos.

Neste período a ópera foi oficialmente considerada um gênero proibido. Entretanto, isto não quer dizer que ela não tenha sido feita: tal como recentemente observamos na história do Brasil, mesmo sob censura, músicos e artistas sempre acabam dando um jeito de fazer as coisas funcionarem, não raro com a colaboração (ainda que inconsciente) de seus algozes.

Na Roma do século XVIII compositores como Antonio Caldara (1670-1736), Alessando Scarlatti (1660-1725) e mesmo o alemão George Friederic Haendel (1685-1759) utilizaram diversos artifícios para que a escritura operística continuasse ocorrendo. Não era incomum a apresentação de óperas em audições privadas nos palácios dos mesmos cardeais que a proibiram publicamente.

Entretanto, a principal forma de driblar a censura eclesiástica era transpor as temáticas profanas da ópera para oratórios ou cantatas, que são espetáculos musicalmente idênticos à ópera, só que dedicados a alguma temática religiosa ou moral e sem a mesma sofisticação cênica.

É a este repertório que está dedicado o mais recente CD da mezzo-soprano italiana Cecilia Bartoli "Opera Proibita" (Decca, R$ 40,00 em média) que conta ainda com a participação do excepcional grupo de instrumentos barrocos Les Musiciens du Louvre, sob a direção de Marc Minkowski.

O álbum, sob a coordenação do musicólogo Claudio Osele, destaca trechos de alguns dos oratórios compostos por Caldara, Scarlatti e Haendel durante esta década de censura. Mais precisamente, foram selecionadas algumas das mais belas de árias que, numa época em que também era proibida a apresentação pública de mulheres, foram originalmente escritas para castrati (isto é, cantores com timbre de voz feminino em decorrência da castração feita ainda quando crianças).

Apesar de todo o interesse às referências históricas inerentes ao projeto, o álbum vale mesmo por mais uma demonstração de virtuosismo e musicalidade de Bartoli, a cargo de um repertório que parece ter sido composto especialmente para ela. Ao mesmo tempo em que a meio-soprano executa com espantosa afinação e precisão rítmica vertiginosas passagens em coloratura (seqüência de notas rápidas na região aguda da voz), como em "Un pensiero nemico di pace" de Haendel, ela garante toda a serenidade necessária às árias menos explosivas, como "Caldo sangue" de Scarlatti.

Porém, boa parte da execelência deste novo trabalho Bartoli está também nas mãos de Minkowski, que com a sonoridade autêntica e penetrante dos Musiciens du Louvre garante a sonoridade de acompanhamento indispensável para o melhor desfrute deste tipo de repertório que ainda é encontrado nas lojas em pobres versões para piano e voz.

Um dos grandes momentos do álbum é a ária "Lascia la spina" do oratório "Il Trionfo del Tempo e del Disinganno" de Handel: trata-se da versão sacra da famosa ária "Lascia ch'io pianga" da ópera "Rinaldo", também de Haendel. Na ópera, o amor terreno. No oratório, as reflexões não menos sugestivas de uma personagem chamada Piacere ("Prazer"). Vale a pena contrastar a com uma gravação que Bartoli fez anteriormente versão profana desta ária.

A adaptação de uma música profana para um texto sacro evidencia até que ponto o oratório e a ópera consistiam, na prática, num mesmo gênero cujas diferenças freqüentemente limitava-sem a questão cênica, já que em termos de temática coisas como o amor terreno, e mesmo o erotismo, sempre não raro apareciam em oratórios, ainda que travestido nos trajes do moralismo eclesiástico. É este prazer que só o fruto proibido pode proporcionar que encontramos pela sedutora voz de Bartoli.

[Publicado originalmente na Gazeta Mercantil. Versão sem cortes, sem edição, sem revisão!]

19 novembro 2005

Georges Fauré

Ou "o que esperar de uma pessoa que é anunciada como um compositor?"

Não, não escrevi errado. É Georges Fauré e não Gabriel Fauré. Na verdade, tudo indica que há um parentesco, mas a verdade é que falta provas que confirmem isto por um motivo muito simples: o compositor Georges Fauré não existe.

Na verdade, ele é o personagem vivido pelo ator Gérard Depardieu no filme Green Card (que no Brasil, pra variar, ganhou o meloso subtítulo de "Passaporte para o Amor"), que re-assisti hoje na TV depois de muitos anos.

Junto com a horticulturalista Brontë Mitchell (vivida por Andie MacDowell), ambos entrelaçam suas vidas num casamento por conveniência: ele para conseguir o green card e ela para conseguir habitar um lindo apê com uma estufa num edifício que não permite solteiros.

O tiro sai pelo gatilhos e os ambos se vêem forçados a simular uma vida a dois para os agentes federais, enquanto que no plano particular Brontë faz questão de reforçar seu status de solteirona independente.

Georges é um estereótipo do homem francês e um músico que abandonou sua profissão.

Em dada altura do filme ocorre a cena que justifica a existência deste post: numa festa num apê da high society, as supostas habilidades musicais de Georges ao piano são requisitadas pela anfitriã, que ainda pondera que "It isn't often we have a Fauré in the house."

Georges-Gérard se senta ao piano e fica lá, imóvel. A expectativa é grande: do lado do expectador, em nenhum momento ficou provado que Georges toca piano ou mesmo que seja músico. Dentro da cena, fica a espera de que se rompa um silêncio constrangedor. E de repente...

Clusters em fortississimo, glissandos caóticos, acordes brutais pelos braços de um pianista que parecer estar em possessão demoníca. Um sobresalto ocorre a todos. O vaso que está em cima do Steinway treme. Um sujeito bonachão que dorme numa bergé acorda assustado. Apenas uma jovem e um velhinho se encontram hipnoticamente fascinados pela cena insólita que estão presenciando. E com uma pontiaguda nota, Georges encerra sua furiosa música.

O velhinho começa aplaudir efusivamente, mas pára diante do silêncio repressor de todos os presentes. À velha anfitriã que o fita, Georges diz timidamente "It's not Mozart...". Com um olhar condescendente, responde apenas "I know".

O interessante desta cena é a pergunta, que no olhar da anfitriã se torna a própria resposta: hoje em dia, o que esperar de uma pessoa que é anunciada como um compositor clássico?

Para um ouvido mais incaulto, Georges se passaria por charlatão, se não fosse o fato dele em seguida atacar com uma música "de verdade", com acordes maiores, menores, progressões e cadências.

A verdade é que, exceto apenas por seus familiares e por seus pares, nunca se sabe o que pode sair das mãos ou da mente de um "compositor". Esta figura tão estranha, quando anunciada fora de seu contexto profissional, torna-se uma verdadeira incógnita.

Se anunciar compositor fora de seu habitat é como você se anunciar um ufólogo: todo mundo levemente já ouviu falar disto, mas ninguém realmente sabe o que isto pode implicar. Seja para seus ouvidos, seja para o vaso que está em cima do Steinway.

15 novembro 2005

Rio de Janeiro e a XVI Bienal de Música Brasileira Contemporânea

Impressões de um visitante tardio

Encerrou-se no último domingo, 13 de novembro, mais uma edição da Bienal de Música Brasileira Contemporânea, no Rio de Janeiro. Patrocinada e organizada pela Funarte, há 30 anos o evento é, ao lado do Festival Música Nova, um dos mais importantes gênero. Mas diferentemente do evento paulista, a Bienal é inteiramente dedicada à música moderna brasileira.

Na posição de compositor, viajei a convite da organização para ter o prazer de ouvir minha peça Itinerário, para clarinete solo, tocada pelo grande Paulo Sérgio Santos no encerramento do evento. Ouvir peças antigas é sempre estranho, ainda mais para um compositor como eu, que tende a tratar sua prole como verdadeiros bastardos. Mas foi uma experiência mais do que gratificante reencontrar este velho filho por meio da musicalidade de Paulo Sérgio . Danke schön, herr Santos!

Há muitas coisas a se falar da Bienal e o que colocarei em seguida são, como bem aponta o subtítulo deste post, apenas algumas "impressões de um visitante tardio", que chegou ao Rio numa ensolarada tarde primaveril e que voltou como sempre volta desta cidade maravilhosa, isto é, ansioso pela próxima vez. Mas vamos às impressões.

- A pluralidade estilística continua sendo a mais evidente característica de nossa música contemporânea, e a bienal, um lugar onde todos os "ismos" (nacionalismos, serialismos, etc.) se encontram de forma bastante amistosa.

- O público foi eclético, alegre e descontraído. Os assobios em homenagem à bela mestre-de-cerimônias já virou uma tradição. Sala Cecília Meireles com a platéia bem cheia e mesmo algumas pessoas na platéia superior. Quem ainda diz que música contemporânea não atrai público, mesmo num evento pago e num dia que "deu praia"?

- Dentro do que me foi perceptível, a organização do evento foi bastante competente, selecionando obras de compositores das mais variadas faixas etárias, dos mais diferentes estilos e das mais diferentes regiões do país (incluíndo aqueles radicados no exterior, que não são poucos).

- No libreto deste ano a Bienal compilou o nome de todos os compositores que passaram por ela e em quantas vezes eles participaram do evento. No total, foram 306 compositores. Os campeões de aparições são Murilo Santos, Mário Ficarelli e Ricardo Tacuchian participaram, nada mais nada menos, de TODAS as dezesseis bienais.

- Nem todos os nomes listados continuam a compor, e alguns podemos nos perguntar como foram parar lá, tendo em vista que a proposta do evento é apresentar obras de compositores vivos (ao menos de uns tempos pra cá). Eis algumas aparições curiosas ao longo da história do evento: os compositores "românticos" Alberto Nepomuceno e Frutuoso Viana, o violonista Sérgio Assad, o musicólogo Olivier Toni e os regentes Daniel Havens (ex Banda Sinfônica do Estado de São Paulo), Aylton Escobar (que sim teve uma importante carreira de compositor) e, vejam só, Jamil Maluf, da OER e do Theatro Municipal de São Paulo.

- Impressão pessoal porém compartilhada por outras "testemunhas auriculares" presentes nos outros concertos: as peças foram bem executadas e muitos compositores saíram satisfeitíssimos com as interpretações.

- Mas a vida não é uma mar de rosas, e eis algumas sugestões de quem está reclamando de barriga cheia: > criar eventos paralelos aos concertos (mesas-redondas, workshops, etc.) > fomentar a interação direta entre público-músicos-compositores, aproveitando a infra-estrutura inerente ao evento > edição e difusão do material desta e das demais bienais em CD ou em arquivos públicos via internet.

De resto, fica a expectativa para a próxima Bienal e de outros eventos do gênero.

Post scriptum: hoje, quarta-feira, a OSB, sob a regência de Roberto Minczuk, vai tocar as "Quatro últimas canções" de Strauss, com a voz de Rosana Lamosa. Faltou tempo e dinheiro pra alongar minha estada, mas se eu estivesse lá, não ia perder não.

03 novembro 2005

Broadway no Municipal

Montagem de "Candide", de Bernstein, estréia em São Paulo

A história se passa em meados do século XVIII, mas é com uma ambientação pop e diversas referências à política e aos políticos atuais (que não parecem ter mudado muito desde então) que a história do anti-herói Cândido surge nos palcos paulistanos.

Trata-se do espetáculo musical “Candide”, do compositor e regente norte-americano Leonard Bernstein (1918-1990), que depois de uma temporada carioca no ano 2000, estreou em “versão concerto encenada” na sexta-feira passada – dia 28 de outubro – no Theatro Municipal de São Paulo, sob a direção cênica de Jorge Takla, com a Orquestra Sinfônica Municipal e o Coral Lírico sob a regência de José Maria Florêncio.

Espetáculo musical é, talvez, o termo menos perigoso para definir esta obra de Bernstein, que em 1956 estreou como um musical da Broadway, mas que desde então passou por diversas modificações para as mais diferentes ocasiões, tal como viria acontecer com sua obra mais famosa, o musical “West Side Story” (no Brasil, curiosamente traduzido como “Amor sublime amor”).

Baseado na novela setecentista “Candide ou L’Optimisme” (“Cândido, ou o Otimismo”) de Voltaire, a versão de Bernstein – em colaboração com a roteirista de cinema Lillian Hellman – surgiu como um meio de ironizar subliminarmente toda a perseguição política empenhada pelo senador Joseph McCarthy nos EUA da década de 1950.

Passado quase duzentos anos desde a primeira publicação da novela de Voltaire e mais de cinqüenta desde sua estréia na Broadway, o “Candide” de Takla preserva sua atualidade temática e renova seu frescor com a interessante que tradução de Claudio Botelho neste espetáculo que, coisa rara na cena lírica, conta com os cantores cantando em bom português.

Cantar musicais não é tarefa fácil para ninguém (mesmo para experientes cantores líricos), mas cantar em português é uma tarefa dificílima que foi superada com relativa desenvoltura pelo estrelar elenco desta produção, que teve como protagonista o tenor Fernando Portari (Candide), que realizou de forma muito feliz a caracterização do cândido herói voltairiano que, no fim das contas, tem muito da melancolia encontrada em diversas personagens do repertório lírico, tal como constatar no belamente interpretado “Candide’s lament”, ainda no 1º. ato.

Apesar do título da obra evidenciar um protagonista, em “Candide” isto não quer dizer uma predominância deste no palco, o que torna responsabilidade sobre os papéis ditos “secundários”.

O barítono Sandro Christopher destaca-se pelo seu cômico Dr. Pangloss, e junto com a soprano Rosana Lamosa (Cunegunda), Sebastião Teixeira (Maximilian), Dênia Campos (Paquete) e com o tenor Paulo Queiroz e o baixo Carlos Eduardo Marcos constituíram um elenco que conduziu de forma bem-humorada a trupe que circunda o confuso Candide ao longo de sua trajetória de provações.

Um dos grandes momentos da noite foi a incendiária atuação da mezzo-soprano Regina Elena Mesquita (Velha Senhora) e do hilariante quarteto de “señores” (Diógenes Gomes, Sandro Bodilon, Miguel Geraldi e Sérgio Weintraub) no número “I am easily assimilated” (“Camaleoa”), evidenciando toda a energia inerente à partitura de Bernstein.

O musical norte-americano é um descendente direto da ópera européia, mas uma das grandes diferenças entre ambas é que, no musical, o cantar é menos “empostado” que na ópera, o que acarreta na necessidade de amplificação eletrônica da parte vocal, o que nem sempre é bem visto tanto pelos cantores como pela audiência lírica. Em “Candide” a amplificação vocal foi sutil e cumpriu sua função de, discretamente, auxiliar os cantores.

Entretanto, ela falhou no que concerne à amplificação da orquestra: a distribuição dos diferentes instrumentos do conjunto em apenas três grupos de alto-falantes dispostos de forma chapada nas laterais e ao alto do palco atribuiu artificialidade ao timbre e à espacialização da orquestra, principalmente em momentos de maior sutileza tímbrica. Faltou aí o conceito de “surround”, tal como feito nos musicais da atualidade.

Apesar deste problema, nada compromete o “Candide” paulistano, um espetáculo que, além de divertido, que conta com a música de um dos grandes músicos do século XX, ao contrário da grande maioria dos musicais da Broadway e do Teatro Abril.

[Publicado originalmente na Gazeta Mercantil. Versão sem cortes, sem edição, sem revisão!]

02 novembro 2005

O compositor e sua prole

Considerações sobre a Peça para Piano II

Ontem me encontrei com a pianista Tânia Lanfer para resolvermos uns problemas burocráticos e ensaiarmos (i.e., ela toca, eu escuto) a peça que ela me encomendou para seu TCC na USP, junto com outras obras de outros jovens compositores: além deste que vos escreve, tem também Bruno Ruivaro, Gláucio Zangheri e Maurício de Bonis.

Aproveitamos que na sala onde iríamos fazer o ensaio haviam quatro especiais alunos meus de história da música moderna e fizemos um pequeno recital, que no fim das contas, acabou servindo como complementação da aula de "música textural" (termo esquisito, mas outra hora me explico melhor) dada no dia anterior. Uma partitura recheada de clusters e indeterminação rítmica talvez seja uma boa forma de visualizar até que ponto mudar seu referêncial musical da nota musical para a escuta tímbrica resulta numa música talvez incomum (se comparado ao feito mais comumente).

É sempre desafiador, interessante e edificante botar uma peça à prova, com músicos escutando-a numa situação na qual há total liberdade de expressão. Uma breve explicação de minhas (más) intenções para com a Peça para Piano II e vamos lá: dona Tânia vestindo suas luvas e em seguida golpeando sem parcimônias o teclado do piano com clusters de palma-de-mão, de antebraço, de punho.

Rolou até os merecidos aplausos, mesmo numa ocasião tão caseira e informal. Não tinha como não ser aplaudida.

E, para O Criador, ouvir o que os outros têm a dizer sobre a peça é sempre, sempre muito interessante. Não sei se gostaram ou não, mas conforme vamos vivendo o mundo da música fica mesmo cada vez mais difícil o discernimento do que verdadeiramente gostamos ou deixamos de gostar. Assim sendo, o sentimento de saber se uma pessoa gostou ou não fica também relativizado. São benéfices (ou maldição?) adquiridas conforme vamos adquirindo repertório.

Esta foi a segunda "apresentação" da peça, a primeira no maravilhoso Steinway da dona Ilma, num especialíssimo sarau em seu apartamento em que rolou até a Sequenza para violoncelo de Berio (!). Mas a prova final ainda está por vir: 11 de dezembro, no número 1313 da Av. Paulista. Até lá, outras águas rolarão em ares guanabarenses...