16 junho 2008

Entrevista: Jorge Takla

Diretor teatral dos mais requisitados quando o assunto é música, Jorge Takla faz-se mais do que nunca presente nos palcos paulistanos. Além de ter estado recentemente em cartaz com sua versão do musical “West Side Story”, de Leonard Bernstein, Takla estréia no próximo sábado sua nova montagem de “Madama Butterfly”, de Giacomo Puccini (1858-1924), no Theatro Municipal de São Paulo. Em 1994 Takla já havia dirigido esta ópera neste mesmo palco, sob a regência de John Neschling. Para esta ocasião – anunciada como comemorativa ao centenário da imigração japonesa no Brasil – o diretor renovará sua visão da famosa história de amor entre a gueixa e o oficial norte-americano, tal como dá a entender na entrevista concedida ao OutraMúsica, em meios aos últimos ensaios antes da estréia.

Antes de começar a dirigir óperas, que tipo de contato tinha com este gênero?

A ópera sempre esteve presente em minha vida. A primeira ópera que vi eu era ainda criança. Foi “L'incoronazione di Poppea”, de Claudio Monteverdi, numa montagem do festival Baalbeck, no Líbano. Mas a verdade é que fui um privilegiado, pois passei minha adolescência na Europa e nos EUA, o que me possibilitou assistir às grandes montagens da década de 1960-70, justamente o momento em ocorria uma grande reviravolta em termos de direção de ópera por meio do trabalho de diretores como Luchino Visconti e Franco Zeffirelli, entre outros.

E como começou a dirigir óperas?

Apesar de sempre estar ligado à música clássica, tendo inclusive estudado canto lírico, comecei a dirigir ópera meio por acaso. Depois de assistir uma montagem que dirigi do musical “Cabaret”, o maestro Jamil Maluf me convidou para dirigir “As Bodas de Fígaro”, de Mozart, em 1989. Desde então já dirigi um total de doze óperas, oito delas com o Jamil. E quero ainda fazer muitas outras.

Quais as principais diferenças entre dirigir uma peça teatro e dirigir uma ópera?

Dirigir ópera é muito mais gostoso, pois é uma forma muito mais completa. Acho que no teatro sempre acaba faltando algumas coisas que a ópera, por conta da música, sempre acaba finalizando. Se pudesse, só dirigia óperas.

Como foi o processo de concepção da montagem desta “Madama Butterfly”?

Trata-se de um grande desafio, pois é uma ópera que todo mundo conhece. Além disto, é uma ópera que traz consigo uma grande carga de estereótipo, por conta das referências à cultura japonesa. Ela é japonesa, mas ao mesmo tempo, é extremamente italiana. Há, portanto, um contraste, pois o japonês é muito discreto, mais velado, e na ópera a tudo é muito aberto, as emoções são cantadas em alto e bom som. É um choque de culturas, e a obra fala justamente disto, pois a música de Puccini expressa de uma forma ocidental sentimentos orientais.

Por isto um ponto importante desta montagem é evitar os estereótipos (tais como a cerejeira, a casa japonesa, etc.), investindo na sugestão de volumes, de cores, e de certa forma fugindo do realismo, resgatando sua essência pela simplicidade, e não pelo excesso.

Chega a ser uma montagem “simbolista”?

Não. Acho que esta montagem está mais para abstrata do que para simbólica, mas apesar disto, todos os códigos dramáticos e seus personagens estão preservados. Sei que seria mais fácil e confortável cair no estereótipo. Mas para mim a “Madama Butterfly” é uma ópera contemplativa. Não pode existir poluição visual e de movimentos. Investi o mínimo em efeitos chamativos, para buscando sua essência e ficando ao máximo na sombra.

Com tudo mais simples, tudo então fica mais exposto. Os cantores, a orquestra e a própria música ficarão mais expostos, e assim a própria obra fica mais valorizada.

Como é trabalhar a dramaturgia com cantores de ópera?

A diferença do trabalho entre um cantor e um ator é que o cantor lírico tem que ter um entendimento muito musical da obra, pois todas as dicas de interpretação dramática estão na própria música. Muito vezes, com atores, eu fico trabalhando meses sua entonação, a “música” contida num texto sem partitura. O cantor, por sua vez, tem sua tem sua partitura, sua música. Mas isto que é uma vantagem é, de certa forma, também uma desvantagem, pois ele não se pode deixar levar pela emoção, pois pode se prejudicar tecnicamente. Ele não pode se entregar passionalmente a um personagem.

No fundo, não adianta fazer o mesmo trabalho que um ator de teatro, pois a diferença é que no teatro um personagem vai amadurecendo ao longo meses. Na ópera, ele tem que estar pronto já na primeira récita, pois depois de uma semana tudo estará acabado.

Neste sentido, é uma experiência rara a que estou tendo com o musical “West Side Story”, onde observei o processo de amadurecimento cênico muito grande nos cantores.

E se pudesse escolher seu próximo projeto em ópera, qual obra gostaria de dirigir?

“Tosca”, de Puccini, porque é teatro puro.


Serviço:

“Madama Butterfly”, de Giacomo Puccini
Direção cênica: Jorge Takla
Direção musical: Jamil Maluf
Cenários: Tomie Ohtake
Figurinos: Fabio Namatame
Elenco: Eiko Senda/Laura de Souza (Cio-Cio-San), Paul Charles Clarke/Marcello Vannucci (Pinkerton), Silvia Tessuto (Suzuki) e Lício Bruno (Sharpless).
Orquestra Experimental de Repertório e Coral Lírico
Theatro Municipal de São Paulo, dias 21, 23, 25 e 27 de junho, às 20h30; dia 29, às 17h. Ingressos entre R$ 20 e R$ 40.

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