A propósito de um debate sobre etiqueta na sala de concertos engendrado na comunidade Orkut Música Erudita / Classical Music:
Como todo manifestação cultural, a música de concerto amalgama um público que com o passar dos tempos passa a criar hábitos todos próprios. Uma vez arraigados neste grupo de pessoas, todo um conjunto de comportamento surge, e então a noção "etiqueta" passa a ser pertinente. Pode até ser que fora da sala de concertos você não siga estes hábito à risca, mas dentro do templo sagrado é vital seguir a etiqueta/regra.
De fato, hoje em dia há uma série de convenções mais ou menos consolidadas. Em concertos e recitais só se aplaude no final da peça (jamais entre os movimentos, ou então você estará condenado à danação eterna). Em relação às óperas, cada uma possui um verdadeiro mapa de aplausos, trechos nos quais a platéia não raro chega a agir como claque (depois de uma ária famosa, de um dó agudo, etc.).
Particularmente, acho que a etiqueta é boa, pois auxilia a concentração do músico e da audiência. Mas a etiqueta deve ser usada como sugestão, não como lei. Deve-se ser superada quando desejado, e quando assim for, o cúmulo da falta de etiqueta é fazer um ruidoso shiiiiiiiiiii para refrear um aplauso espontâneo. Volta-e-meia a tal "etiqueta de concertos" inibe a espontaneidade do público e, quiçá, do próprio músico.
Vale a pena lembrar que o que hoje se considera "boa etiqueta" no passado não era bem assim. Mozart, em suas cartas, relata que o público parisiense aplaudiu uma sinfonia sua no meio do primeiro movimento (sim! durante a execução da música). Sobre um certa sinfonia de Beethoven (escrevo de cabeça, desculpe-me), relata-se que o público não só aplaudiu entre os movimentos, como também pediu para repetí-lo antes mesmo que as demais partes fossem tocadas.
Afinal, onde reside o meio termo entre a espontaneidade e a falta de etiqueta?
Pessoalmente, não aplaudo entre os movimentos, mas não vejo nenhum problema em quem o faça.
Para mim, a verdadeira falta de etiqueta reside numa conversa feita durante a música, num papel de bala sendo demoradamente aberto, no surto de tuberculose que acomete parte da platéia entre os movimentos (antes os aplausos do que as tosses, oras bolas!), nos bips sonoros dos relógios (tem os de 15 em 15 minutos, os de 30 em 30, e os de 60 e 60) e, é claro, nos celulares que tocam no meio de um espetáculo.
Não é aí onde reside o cúmulo da falta etiqueta?
2 comentários:
Pessoalmente, sinto uma enorme saudade dos tempos em que, na ópera, se aplaudia a cada passagem de bravura dos cantores. Era espontâneo aplaudir-se o agudo do tenot no "Vittoria, vittoria" no meio da cena pós-tortura da Tosca, enquanto a orquestra continuava e o soprano se descabelava. Tudo fazia sentido, era como se nós do público, à guisa de um coro grego sem corifeu, comentassemos a ação e o trabalho dos cantores.
Ninguém esperava que "a Donna è mobile"chegasse ao final para aplaudir.
Hoje, ficamos mais educados, por força das imposições que vieram importadas das salas de concerto, onde só se aplaude no final. Pobre Gilda, se esfalfa em seu caro nome, e ninguém aplaude porque "não fica bem", "tem de esperar a orquestra terminar, é assim que gente educada procede, etc.etc.". A coitada da filha do Rigoletto recebe uns pífios aplausos pois quando a orquestra termina, ela já saiu de cena há um tempão.
Tive, ao longo destes anos, a oportunidade de perguntar a vários cantores aqui e fora se é verdade que os aplausos lhes tiram a concentração e influem negativamente no exercício de sua arte: não houve um - ou uma - que me dissesse ser verdade. Ao contrário, o aplauso estimula a adrenalina, ao mesmo tempo em que o cantor de ópera sabe como sua arte está chegando ao público.
Meu conselho: Quando forem à ópera, mandem a elegância às favas: aplaudam sempre que acharem que devem, com direito a gritar Bravo também. Ópera não é música de câmera, são universos diferentes.
Estou de acordo com você. Acho que as "regras já existentes" não devem ser rígidas,e o melhor aplauso é aquele espontâneo...
Já lí, não me lembro onde, que esta "etiqueta" afasta muito, o público menos informado dos Concertos da Música chamada Clássica. Aliás porque a divisão entre clássica e erudita ou dazelite e daznãoelite???
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