09 setembro 2005

Beethoven à brasileira

Osesp aborda obras do compositor alemão em CD e em concerto.

Passado 178 anos desde sua morte, mesmo nos dias de hoje, é ainda difícil avaliar a real amplitude da obra de Ludwig van Beethoven (1770-1827). Nascido na cidade alemã de Bonn, Beethoven aprendeu composição com grandes nomes do período clássico, tais como Joseph Haydn (1732-1809) e Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791). Nos manuais de história da música, Beethoven é considerado um compositor de transição entre os períodos Clássico e Romântico (aproximadamente, concernentes aos séculos XVIII e XIX, respectivamente). Porém, a importância de sua obra jamais se limitou a uma mera “ponte” entre duas formas de compor.

Praticamente desde sua morte, a música de Beethoven passou a ser importante referência para compositores das mais diferentes épocas e estilos. Franz Schubert tinha Beethoven quase como um deus. Richard Wagner credita às suas sinfonias toda sua base musical e moderno Arnold Schoenberg elabora uma consistente lista dos aprendizados que tirou dos estudos de suas peças. Mesmo na babel musical da era contemporânea, não é muito difícil detectar ecos do grande mestre alemão.

Beethoven é um dos raros exemplos da história da música (se não o único) em que praticamente toda sua produção é canônica, isto é, parte integrante e inexorável do seleto rol de obras primas sobre o qual está construída a noção de tradição, noção que há séculos têm levado o homem às salas de concerto e teatros ao redor do mundo.

A importância conferida às obras de Beethoven as tornam obrigatórias no repertório de qualquer músico ou conjunto. Nenhum pianista conquista credibilidade sem ter encarado ao menos uma boa parte de suas 32 sonatas (e não são raros aqueles que se dedicam a enfrentar todas). Nenhum quarteto de cordas pode-se considerar maduro sem ter vivenciado a verdadeira teia estilística das obras que escreveu para esta formação. Nenhuma boa orquestra pode se considerar como tal sem ter percorrido todo o ciclo das nove sinfonias.

Os três CDs que a gravadora carioca Biscoito Fino têm distribuído desde o final do mês passado são uma documentação de uma parte do trabalho da consolidação da excelência artística que a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo) vêm batalhando desde o início de sua reestruturação em 1997, levada a cabo pelo maestro John Neschling e, até bem recentemente, contando com importante apoio do maestro Roberto Minczuk, atual diretor do Festival de Inverno de Campos do Jordão e da OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira, sediada no Rio de Janeiro).

De uma forma geral, os CDs lançados até agora abordam uma faceta pouco conhecida – mas nem por isto desinteressante – da obra sinfônica de Beethoven ao selecionar para dois CDs quatro de suas sinfonias menos populares (isto é, as Nos. 1, 2, 4 e 8) e duas aberturas orquestrais (“Egmont” e “Coriolano”), todas estas regidas por John Neschling entre os anos de 2000 e 2004. A exceção fica por conta do CD dedicado à aclamada “Nona Sinfonia”, gravado em 2004 sob a regência de Roberto Minczuk. Todas as faixas do CDs são combinações de diferentes apresentações realizadas ao vivo na sede da orquestra, a Sala São Paulo.

Mas, afinal, qual a importância do projeto de CDs de Beethoven com a Osesp? No plano internacional, nenhuma, pois o que não falta no mercado são gravações de suas sinfonias, e apenas muito poucas propõem diferenciais que possam se destacar das demais. As gravações da Osesp não apresentam algo realmente instigante, apesar de algumas diferenças perceptíveis para os beethovianos mais argutos, tais como algumas notas e mesmo trechos diferentes na “Nona” (em virtude da mais recente edição elaborada sobre esta sinfonia) e a maior proximidade com as velocidades metronômicas originalmente indicadas por Beethoven em suas partituras, em geral mais rápidas do que as famosas gravações de Hebert von Karajan (esta característica está mais perceptível nas gravações conduzidas por Neschling).

Esta falta de apelo internacional demonstra-se consciente à própria Osesp na medida em que os CDs de Beethoven serão lançados apenas nacionalmente, ao contrário de outros seis, totalmente dedicados a compositores brasileiros – isto é, Villa-Lobos, Francisco Braga, Francisco Mignone e Camargo Guarnieri – que foram produzidos e lançados nacionalmente e internacionalmente pelo selo sueco Bis, estes sim contribuições singulares à música brasileira e clássica como um todo.

Porém, se você estiver montando uma discoteca básica (na qual as sinfonias de Beethoven não podem faltar) os CDs da Osesp são uma alternativa boa e barata. Um primeiro, porém certeiro passo para o universo sinfônico beethoviano que pode inclusive ser conferido ao vivo nos dois próximos fins-de-semana, quando a orquestra, sob a regência de Neschling, interpretará as sinfonias Nos. 5, 6, e 7 e a abertura “A Consagração da Casa”. Estes concertos que serão gravados e fazem parte do projeto que tem por objetivo o ciclo integral das sinfonias de Beethoven, também a ser lançado pela Biscoito Fino. Um programa imperdível, na medida em que ouvir Beethoven nunca é demais.

[Publicado originalmente na Gazeta Mercantil. Versão sem cortes, sem edição, sem revisão!]

3 comentários:

Anônimo disse...

bacana. vi q ele está hj na loja clássicos autografando esse CD, mas não consegui ir. beijos, pedrita

Denis Mani disse...

Estou acompanhando seu blog, muito bacana.
O Daniel Motta que me indicou. Sou um leigo em música erudita, mas me interesso e estou procurando saber cada vez mais.
Parabéns, e obrigado pelo seu tempo!

Leonardo Martinelli disse...
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